Com o campeonato nacional na sua recta final e a recente consagração do FC Porto como campeão, achei oportuno refletir novamente sobre a competição mor do futebol português.
Cinco. Este é o número de campeões que o campeonato da primeira divisão portuguesa já teve, em 86 edições. Benfica (37), FC Porto (29), Sporting (18) e Belenenses e Boavista com 1 título cada.
Para dar perspectiva, convido-vos a olhar para as principais ligas europeias:
Inglaterra – 24 campeões (131 edições)
Itália – 16 campeões (115 edições)
França – 15 campeões (91 edições)
Alemanha – 15 campeões (92 edições)
Espanha – 9 campeões (88 edições)
Ok, talvez seja demasiado ambicioso comparar ligas tão históricas, de países com tantas cidades de grande dimensão e importância, com a nossa humilde primeira liga. Se calhar é melhor olhar para países que tenham uma bitola mais parecida à nossa:
Holanda – 15 campeões (115 edições)
Bélgica – 16 campeões (116 edições)
Áustria – 15 campeões (107 edições)
Escócia – 11 campeões (123 edições)
Suécia – 19 campeões (119 edições)
Dinamarca – 20 campeões (107 edições)
Noruega – 16 campeões (74 edições)
Grécia – 6 campeões (84 edições)
Ok, confesso que não esperava estes resultados antes de ter investigado. Tudo bem que o objectivo era deixar o campeonato português mal visto, mas isto está a ganhar contornos de bullying.
Então e se forem aquelas ligas europeias assim mais carrasconas? Aquelas que às vezes nem os próprios cidadãos de lá querem saber. Agora estou nisto por orgulho! Preciso de saber se há alguma liga europeia com menos campeões que a nossa.
Hungria – 14 campeões (117 edições)
Bulgária – 16 campeões (85 edições)
Polónia – 12 campeões (79 edições)
Chipre – 10 campeões (79 edições)
Irlanda do Norte – 12 campeões (119 edições)
Islândia – 11 campeões (106 edições)
Turquia – 5 campeões (63 edições)
Porra, nem sequer podemos dizer “chupa, Turquia!” porque os gajos têm menos um terço das edições em comparação connosco!
Já agora, deixo algumas ligas que surgiram na altura do fim da Guerra Fria e do desmantelamento da União Soviética (claro que é batota haver ligas mais novas que eu, mas pronto):
Rússia – 6 campeões (27 edições)
República Checa – 5 campeões (27 edições)
Eslovénia – 6 campeões (28 edições)
Eslováquia – 8 campeões (26 edições)
Croácia – 4 campeões (29 edições)
Ucrânia – 3 campeões (28 edições)
Bem, que estopada! É certo que a quantidade de campeões diferentes numa liga não determina a sua qualidade… Mas determina em boa parte a sua competitividade!
E se é verdade que na maioria das ligas acima referenciadas nas últimas décadas também se instalou alguma hegemonia, havendo cada vez menos lugar a surpresas (exceptuando o mítico Leicester de 2015/16), não é menos verdade que a história do campeonato português cultivou uma certa previsibilidade desde cedo.
Ouvimos frequentemente muitos comentadores na televisão dizer que o nosso campeonato não é competitivo, com claro prejuízo para os clubes desses mesmos comentadores (pois se são comentadores e estão na televisão, hão de ser dos 3 do costume!), que, habituados ao pobre nível da competição interna, quando vão às competições europeias ombrear com outras equipas, tendem a fazer prestações paupérrimas, sobretudo nos últimos anos.
O problema existe, eles próprios sabem reconhecê-lo! E reconhecer a existência do problema seria o primeiro passo para tentar uma mudança, não fosse a hegemonia ter como principal característica o facto não incomodar assim tanto aqueles que dela beneficiam: a maioria dos adeptos portugueses.
É muito fácil dizer que se quer ter um campeonato mais competitivo, mas se na prática isso implica que a nossa equipa seja menos vezes campeã, se calhar é melhor deixar como está. Já é tão complicado vencer o título quando só um dos adversários dá verdadeiramente luta, imaginem agora meter mais 5 ou 6 equipas ao barulho!
A qualidade do nosso campeonato — neste caso, a falta dela — é um fiel retrato do país real: centralizado, bipartido em duas grandes metrópoles, com nítidas sequelas deixadas pela pobreza que fustigou o país durante grande parte do século XX e com uma mentalidade só esporadicamente bairrista, se convir.
O futebol sempre alimentou a alma e o ego do povo, sobretudo nos tempos em que o alimento do estômago escasseava. Há quem não tenha, na vida pessoal, maior alento que as vitórias do seu clube e não há povo que, na sua história, tenha precisado tanto de alento como o povo português.
Um campeonato mais competitivo tem o preço óbvio da nossa equipa ganhar menos vezes. Se isto a nós, adeptos do Portimonense, pouco ou nada custa porque já é o pão nosso de cada dia, para quem está habituado a vitórias a cada jogo e títulos a cada época, pode ter um peso desmoralizante considerável. Mas, como diz o ditado, com o mal dos outros posso eu bem, sobretudo se o mal em causa for não ser campeão nacional.
Não quis com este texto provocar ninguém ou impor qualquer tipo de moral. Cada um tem o direito de torcer por que clube quiser. No entanto, o exercício dessa liberdade (que não pode nunca ser posta em causa) traz consequências.
Torçam por que clube bem entenderem, pelas razões que acharem adequadas. Mas quem, com o ser fervor clubístico, não contribui para que o paradigma se altere, não poderá lamentar-se no futuro da falta de competitividade do campeonato nacional, sob pena de incorrer na chamada hipocrisia.
Realisticamente falando, o mais provável é isto continuar como está.